sábado, 21 de abril de 2012

KINKADE - CHUVA

KINKADE - CHUVA
O ar está parado, tenso, denso.
A umidade é uma segunda pele colada ao corpo,


A chuva esperada não se solta.
condensou-se,
é um nó apertado na garganta
que não desata e sufoca.

Vânia


O PEQUENO RIO


Era uma vez um pequeno rio.  Era pequeno porque nascera há não muito tempo. Seu berço era em algum lugar alto perto das estrelas.
Cresceu devagarinho e foi escorregando, rolando pela montanha, bebendo chuva, catando pedregulhos pelo caminho de seu corpo, carregando areia e cascalho.
Era menos que um rio, mais que um filete de água, um rio pequeno, transparente e limpo.
Contente ia abrindo caminho por entre as margens e o campo. Desviava dos outros rios, como lhe ensinaram as nuvens e as estrelas, pois não queria ser um afluente. Queria ser um rio a caminho do mar.
Queria fazer parte sim, mas do oceano.
Aprendeu cedo a desviar, a fazer curvas, sinuoso e atento.
Ia assim coleando pela campina, contente de ver o mundo, de oferecer sua água limpa aos que vinham às suas margens com sede.
Até que um dia, no meio do caminho, uma grande  rocha lhe barrou a passagem. Pediu licença para passar, mas ela não respondeu. Fitou-o duramente e permaneceu inarredável, intransponível e soberba.
Represado, foi se avolumando de raiva, mas nada que fizesse o ajudaria a passar por ela.
Seu corpo líquido já não estava tão limpido.
Começou a chorar e a salgar suas águas. Além de meio turvas, perderam a doçura por um momento.

À noite veio e com ela a lua...
Ela veio molhar seus pés redondos e cor de prata no pequeno rio. Ele chorou para a lua. A lua lhe disse:
- Esqueceste do recado das estrelas?
- Acho que sim. – respondeu mal-humorado e triste.
- Elas te ensinaram a desviar, fazer curvas. Este é teu dom, esqueceste?
- Dom?
- O dom de ser flexível.
- Mas por que tenho de ceder? Por que ela, a rocha, tem de ser tão dura e impermeável?
- Não tens de ceder. Contornar é a palavra. Contornar para continuar em teu caminho para o mar. Ela não sairá do lugar, não vai conhecer o mar. Irá desgastar-se com o tempo. És mais feliz que ela.
O pequeno rio entendeu.
O percurso se tornaria mais longo, mas ele o faria.
Entendeu que não estava assim se submetendo à força da rocha. Ao permanecer teimosamente diante do obstáculo, é que se perdia de si mesmo, perdia a oportunidade de poder continuar e evoluir para a sua finalidade.
Contornou a grande rocha. Levou tempo, mas já não importava, pois sabia que, lá na frente, distante, mas já visível e imenso, o Oceano o esperava.

Vânia


sexta-feira, 20 de abril de 2012

A ÚLTIMA FLOR


Eu ia tão distraída,
quando vi, no alto de uma árvore nua,
uma grande flor branca se abrindo.
Era a última flor que ainda restara viva
entre os galhos estendidos para o céu.

Enquanto eu olhava, ela abriu asas e alçou voo, surpeendendo-me.

Não despetalou...

Não era flor...
Era uma garça... branca... florescendo,  
no alto da árvore desfolhada.

Vânia - escrito quando transitava pela Av. Ipiranga. Como não tinha uma máquina fotográfica comigo, copiei estas imagens do Google.



sábado, 14 de abril de 2012

NUVENS


Abri a janela para um céu cinza e nuvens do mesmo tom: cinza.
Devo estar cinza por dentro.  
Depois de um tempo, uma chuva miúda, diagonal, começou a cair suavemente lá fora, umedecendo de leve o telhado das casas.
Olhei dentro de mim e as nuvens cinza ainda estavam lá.
Olho no espelho meus olhos alagados de melancolia represada.
Dentro de mim não chove.
O tédio é maior que a tristeza.
O tédio é cinza.

Vânia -


sexta-feira, 13 de abril de 2012

PROVÉRBIO SIOUX


“Não ande atrás de mim, talvez eu não saiba liderá-lo.
Por favor, nem ande em minha frente, talvez eu não saiba segui-lo.
Ande ao meu lado para que juntos possamos crescer e galgar os degraus da Elevação da Consciência.” (Provérbio Sioux)

CONTEMPLAÇÃO

Só quando nada cobiçamos, só quando o nosso olhar se torna pura contemplação, é que se abre a alma das coisas, a beleza.
No momento em que o querer se cala e a contemplação surge, a visão torna-se pura e o ser se abandona, tudo se transforma... Tudo fica belo e digno de atenção... A contemplação não é exploração ou crítica – é apenas amor.
Herman Hesse – Minha Fé.

CONTEMPLAÇÃO






O que é contemplar?
Passeio meu olhar inquieto sobre a superfície das coisas. Não mergulho nelas. Apenas sigo o contorno de seus aparentes limites. Tenho pressa...
Para contemplar é preciso sossegar o olhar, desconversar.
Quando não consigo calar a mente, esta que, desde que descobriu as palavras, pôs-se a tagarelar, sem parar, interrompendo essa algaravia de sons e ruídos dentro de minha cabeça:
"Para! Sossega! Deixa que ela vá na frente. Distancia-te dela, ficando para trás. Deixa que ela vá, repetindo o cordel de ideias fixas que inventou e assimilou até tornar-se um murmúrio e depois... no silêncio, deixa-te ficar...’
A mente quer saber o porquê das coisas: Por que isto? Por que aquilo? Se mete em tudo, até no coração, que apenas sente. Quer explicações, até para o amor, que é inexplicável. Julga, analisa, opina, atrapalha o olhar que é influenciável.
 Descobri uma coisa em minhas recentes e nem sempre bem sucedidas tentativas para meditar, deixo que o objeto contemplado me absorva, me fale de si mesmo para um lugar em mim capaz de ouvir e ver.
Tento ver  e ouvir como se fosse a primeira vez.
Na contemplação, surpreendo-me, fico extasiada. A rotina se transforma em novidade, O já visto tantas vezes vira inusitado. E contemplar torna-se uma redescoberta do objeto contemplado e de si mesmo. Por que quem contempla o que está fora, descobre o que está dentro. Descobre-se.
Neste escasso espaço de tempo em que me tornei contemplativa, descobri que me tornei mais atenta. Menos distraída, Mais alerta e, no entanto, pacificada.
Mas este é apenas o começo.
Ainda não me aventurei no deserto. Contemplo confortavelmente instalada nas dunas de meu sono leve, cheirando a amaciante.
Ainda assim é um começo.