domingo, 27 de janeiro de 2013

SENTIMENTO OCEÂNICO


Ultimamente tenho me sentido presa de uma inexplicável (ou explicável) angústia existencial. Conversando com algumas pessoas mais próximas, descubro nelas a mesma sensação. Como se estivéssemos misteriosamente unidos por fios invisíveis de pensamentos e sentimentos, enredados na mesma teia gigantesca da vida.
Hoje, após a notícia da tragédia que ocorreu em Santa Maria, ficou mais evidente esta ligação com ‘o outro’. Fui engolfada por uma dor que não era diretamente minha, mas que também era minha. Eu me tornava parte e membro das famílias que sofreram suas perdas terríveis.
Abri o livro que, há dias atrás havia separado para doar, pois já lera e não tinha intenção de reler. Acabei relendo um capítulo e ‘enxergando’ significados que antes não vira.
Nele encontrei o trecho: “mesmo estando ‘tudo em ordem’, não conseguimos ficar alguns minutos ‘pensando na vida’ sem ser invadidos por indefinível sensação de tristeza”.
Pensei: ‘é isto’. Esta sensação é minha, mas não é só minha. É o que, por alguma sintonia, devido a minhas vivências, circunstâncias de vida e reações a elas, atraio para mim. De certa forma me predisponho e me abro para senti-la.
Estamos todos, gotas individuais, mergulhados no mesmo oceano de sensações. A água que se turva de óleo se alastra e contamina todas as outras. Nos dissolvemos no todo. Somos parte infinitezimal e, no entanto, somos oceano.
No livro citado, o autor se refere a um “sentimento oceânico”, de que fala Romain Rolland.
E eu concluo, sem a pretensão de acertar, que o que nos perturba é o que também nos pode curar. A consciência de indissolubilidade, nos pode ensinar que temos o poder de influenciar, não só de ser influenciados. Podemos treinar a capacidade de nos imunizar, pela cura da gotinha que somos através do amor.
Não ouso falar de um amor maior, que transcende a minha capacidade, pelo menos.
Falo de um amor que é mais uma aceitação de nossos defeitos e de compaixão por nós mesmos. Isto é possível após o reconhecimento de quem verdadeiramente somos.
Freud fala do ‘sentimento oceânico’ como um tipo de religiosidade . Ele admitiu que o recurso ao amor como centro de tudo, como uma das mais eficazes ‘técnicas de viver’. Ele falou do medo de amar, que paradoxalmente transforma o amor que deveria curar em algo assustador. Ele disse,escreveu, que nunca nos tornamos tão desamparadamente infelizes como quando perdemos o objeto amado ou seu amor. Então, por medo de amar, as pessoas não amam. Sofrem por medo de sofrer.
Resta-nos amadurecer, evoluir espiritualmente, para amar não uma pessoa, mas o amor em si, amando todos os homens, e não apenas determinadas pessoas.
À medida que amadureço, sinto mais a dor do outro como minha, a empatia se estabelece mais facilmente e, se isto me faz chorar, como hoje, também me faz sentir pertencente, membro da grande família humana.
Amadurecer deve ser isto. Evoluir faz parte disto.
Evoluir é como subir uma escadaria. Não temos o dom da ascensão que nos eleva, como Cristo, ao alto dela. Mesmo ele, antes de ascender, subiu carregando sua cruz.
Evoluir exige fôlego. Exige não desistir, mesmo quando não se sabe quando alcançaremos o cume.



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